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Semeando Espinhos - 3ª parte


Dir-se-ia que no rol das defecções, deserções, fraquezas e delitos do mundo, os problemas afetivos se mostram de tal modo encravados no ser humano que pessoa alguma da Terra haja escapado, no cardume das existências consecutivas, aos chamados "erros do amor". Penetre cada um de nós os recessos da própria alma, e, se consegue apresentar comportamento irrepreensível, no imediatismo da vida prática, ante os dias que correm, indague-se, com sinceridade, quanto às próprias tendências. Emmanuel – Vida e Sexo – F.C. Xavier – Cap XXII

Madeleine relutou um pouco, ainda na esperança de que o amante pudesse sensibilizar-se com a ideia da paternidade. Em vão passaram-se os dias, onde ele negava-se, inclusive, a frequentar a sua alcova, o que para ela tornou-se insuportável. Numa madrugada quieta e fria, envolta numa ampla capa, tomou um coche e internou-se no bosque sombrio onde morava a curandeira. Horas depois o crime estava consumado. Oculta pelas espessas cortinas do veículo, uma mulher percorria o caminho de volta ao seu palacete, trazendo o ventre vazio e o coração opresso por densas nuvens de amarguras.

Aquele gesto impiedoso trouxera-o de volta para a sua alcova. A cada encontro proibido o abismo de comprometimento abria-se mais e mais aos pés de ambos.

Homem ou mulher, adquirindo parceira ou parceiro para a conjunção afetiva, não conseguirá, sem dano a si mesmo, tão-somente pensar em si. Referentemente ao assunto, não se trata exclusivamente da ligação em base do matrimônio legalmente constituído. Se os parceiros da união sexual possuem deveres a observar entre si, à face de preceitos humanos, voluntariamente aceitos, no plano das chamadas ligações extralegais acham-se igualmente submetidos aos princípios das Leis Divinas que regem a Natureza. Cada Espírito detém consigo o seu íntimo santuário, erguido ao amor, e Espírito algum menoscabará o "lugar sagrado" de outro Espírito, sem lesar a si mesmo. Vida e Sexo – Emmanuel – F.C. Xavier- Amor Livre.

Agora eram dois os lares desrespeitados, porquanto ele se casara com a rica condessa, herdeira de vastos domínios, filha única, condição que lhe permitiu ascendência social e financeira. Devasso e de posse da riqueza da infeliz consorte, tornou-se mais e mais permissivo.

Havia entre os amantes um liame infeliz, vicioso, que se assemelhava ao abraço das parasitas à arvore que as nutre. Nesse conúbio infeliz mais uma vida foi sacrificada, antes de nascer, pelas mãos terríveis da megera do bosque.

A relação adúltera começou a provocar comentários na corte, tão despreocupados se tornaram os parceiros com os cuidados que, inicialmente, votavam aos seus encontros. Nas festas públicas eram vistos, trocando olhares intensos e escandalosos. Nos bailes da corte as danças repetiam-se, exageradamente, desconfortando a nobreza e tornando-os alvo dos mexericos da criadagem. Joias de grande valor eram adquiridas pelo cavalheiro e não eram entregues na residência da esposa, que dividia seu infortúnio de mulher desprezada com as aias e demais damas da corte.

O fato chegou, logo, à ciência do general. Num de seus retornos, coberto de louros das campanhas empreendidas foi cientificado, pelos ávidos maledicentes palacianos, do que acontecia na sua ausência. O velho soldado, acostumado a dobrar tantos inimigos e a vencer as mais renhidas batalhas era, também, um homem bom. Amava a jovem esposa. Nunca se lhe apagaram da memória aqueles olhos negros brilhantes, com um misto de raiva e medo, fitando-o do meio de um monte de feno, naquela manhã sangrenta, quando arrasaram a aldeia que havia se tornado o maior foco de resistência ao Imperador. Aquela visão encheu sua alma de ternura, que ele não sabia dizer ou externar, mas a amava da sua maneira. Não se iludia, porém, com os sentimentos da sua mulher. Muito jovem e solitária, porquanto ele demorava-se longos meses no comando das tropas, imaginava que um dia aquele impetuoso coração cederia aos arroubos de alguma afeição mais próxima.

Sofria, sofria sim. Qual o homem não sentiria o aguilhão de uma traição?

Seu ímpeto era libertá-la para que seguisse o caminho escolhido, mas pensava em sua honra, nos brios da sua família, na sua posição junto ao Imperador, afinal era um herói nacional e um herói precisa dar as respostas que dele são esperadas.

Não desejava o mal de Madelleine. Compreendia o quanto ela deveria ter lutado contra os sentimentos. Mas o que dela gostaria de ter: o amor, o carinho, a fidelidade sabia que jamais o teria. Nunca menosprezara um inimigo, em longos anos de caserna. Sabia reconhecer uma derrota, e ele a perdera. Mesmo que utilizasse a sua autoridade de marido e a mantivesse consigo, seria inútil.

Naquele dia, retornando à casa despediu-se em seguida da esposa, dizendo-lhe que visitaria algumas herdades próximas para descansar das longas e rudes marchas, pois sentia a saúde abalada. A consorte, a contragosto, insistiu debilmente para acompanhá-lo, ao que ele se opôs com veemência. Partiu e os amantes sentiram-se à vontade para continuarem os encontros furtivos, nem suspeitando que o experimentado general também sabia alinhar táticas para colher os seus adversários na vida pessoal.

O velho soldado voltou para casa no meio da noite seguinte, pois não se distanciara muito dela, e surpreendeu os amantes. Poupando-se da humilhação que produziria o confronto com o rival, aguardou-lhe a saída e após, despediu a adúltera, diante dos criados, generosamente, permitindo que ela levasse consigo as roupas, jóias e demais presentes que lhe dera durante o período esponsalício.

O general era um homem pacífico, conquanto eminente estrategista de tantas guerras. Sua dor era matizada por uma misericórdia que nasce nas boas almas.

A misericórdia é o complemento da brandura, porquanto aquele que não for misericordioso não poderá ser brando e pacífico. Ela consiste no esquecimento e no perdão das ofensas. O ódio e o rancor denotam alma sem elevação, nem grandeza. O esquecimento das ofensas é próprio da alma elevada, que paira acima dos golpes que lhe possam desferir. O Evangelho segundo o Espiritismo – Capitulo V – item 4

continua...

O texto acima é parte de uma história cujos capítulos serão publicados,

nesta coluna, todas as sextas-feiras.

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