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Náufrago em Resgate - Cap. 13



Não há coração tão perverso que, mesmo a seu mau grado, não se mostre sensível ao bom proceder. Mediante o bom procedimento, tira-se, pelo menos, todo pretexto às represálias, podendo-se até fazer de um inimigo um amigo, antes e depois de sua morte.[1]


Encolhido no camburão ele pensava no alto custo que o crime cobrava, preço que pagava, a cada dia, pelos erros cometidos. Ao chegar naquele presídio, encontrou um homem bom e justo, em um lugar em que pela primeira vez ouvia pessoas dizerem que embora criminoso ele precisava ter o necessário, ser tratado como um ser humano e assim ter condições de se reeducar. Mas que nada! O visgo do crime viera grudado nele. Encontraram-no e ele novamente se deixou seduzir pelo mal que faz eco na sua intimidade. Não culpava Dóris, pois como ele, ela também era uma alma frágil que cedeu aos apelos de uma vida que julgava mais fácil e que se revelava a cada dia mais e mais dura e tão difícil de se desvencilhar.

Seu pensamento voou para a Tia Méri e seu grupo de jovens, que tanto bem fizeram ao seu coração. Naqueles dias ele chegou mesmo a sentir que poderia seguir Jesus, até a fantasiar que era o bom ladrão e que um dia estaria com Jesus, mas tudo transcorreu de forma tão diferente.

Magaldi recolhia as reflexões do seu filho querido e também se sentia entristecido, embora confiante na Misericórdia Divina que sempre dá uma nova chance a quem verdadeiramente esteja determinado a se erguer das trevas de si mesmo.

Luiz Fernando sabia que estava sentenciado para morrer. Não há como escapar, pensava, depois de uma delação como a que fizera. E então ficou a imaginar porque ele não se dispusera à morte, quando Dóris o buscou com as propostas de cometer novos delitos? Tivesse ele morrido por não ceder, do que ter cedido e agora estava submetido ao mesmo resultado.

Apenas algo o aliviava um pouco. A vida de Alcebíades e dos agentes que o tratavam com respeito na prisão, assim como a de Dóris, estariam a salvo.

Alcebíades conduzia com extremo cuidado a movimentação para frustrar o ataque em andamento.

Muitas frentes de proteção eram necessárias, principalmente para que inocentes como a sua família não ficassem a mercê dos criminosos que tão logo identificassem a alcaguetagem de que foram alvo, buscariam de todas as formas se cercarem de reféns para a fuga.

Lembrava, minuciosamente, os dados repassados pelo prisioneiro. Por onde passavam as drogas que adentravam ao presídio, os agentes envolvidos no acobertamento, o nome dos traficantes que tinham chegado à cidade e todas as tratativas para o seu sequestro, que ocorreria na chegada ao presídio, pela manhã, bem como a combinação para a extração de Fernando. O experiente servidor sabia que a movimentação do preso deveria ter posto em alerta os carcereiros e seus contatos envolvidos na operação criminosa.

O aparato judicial foi ajustado em questão de poucas horas e os traficantes presos, os agentes também, e Dóris foi posta em programa de proteção de testemunhas.

Observando Alcebíades e mais uma dúzia de policiais, bem como o juiz que despachou as ordens de busca, prisão e apreensão, assim como os seus assessores, Magaldi e demais tarefeiros do Alto percebiam que todos seguiam estritamente as disposições legais, mas inspirados por equipes de seareiros espirituais sob a liderança de Cesar, o que facilitava a operação com as intuições para preencher as lacunas das informações prestadas por Luiz Fernando, que não tinha toda a dimensão do que estava acontecendo.

Foi um dia longo, de muito trabalho. Noite alta, Alcebíades ainda se mantinha no presídio, conferindo documentos e revendo todas as instalações para ter a dimensão do comprometimento de segurança que as frustradas ações podiam deixar.

O cansaço era mesclado com ao dissabor de perder colegas que se renderam ao crime. Os dois agentes que estavam sob suspeita, tiveram seus nomes também apontados por Dóris, além de terem sido encontradas, em suas residências, provas indiciárias das suas implicações.

O Diretor meneava a cabeça inconformado, enquanto as lágrimas começaram a escorrer pelo rosto. Era duríssimo perceber que colegas que deviam velar pela vida e segurança uns dos outros, se transformam em agentes infiltrados do crime, comprometendo a vida dos seus pares.

Nisso ouviu vozes alteradas no corredor. Um grupo de policiais trazia armas, estuques, uma pistola 9 mm e até um fuzil desmontado, além de munições que encontraram na varredura feita nas celas. Um dos agentes ao forçar a parede de um dos compartimentos descobriu o acesso, quase chegando ao exterior, com todo o pequeno, mas letal arsenal escondido. Aquela era a última varredura do dia, apesar de muitas terem sido feitas algumas equipes sentiam que deviam continuar e isso foi providencial, porque em poucas horas de escavação no tijolo uma grande brecha se abriria para a rua, libertando elementos de uma quadrilha rival do bando do preso delator, deflagrando uma guerra nas comunidades onde eles disputavam espaço.

- Como pode isso entrar bem debaixo do nosso nariz? Tem mais gente enrolada aí, falava um dos policiais que chefiava a equipe. Você dá mole pra esses caras Alcebíades. Joga eles na solitária um mês que você arranja a cabeça deles bem rápido.

- Tu achas mesmo isso Afonso? E o que eu faço com os nossos colegas? Que não prezam a vida dos seus parceiros de trabalho? Queres lealdade dos presidiários e dos teus colegas, que tomam chimarrão, riem nas festas, dividem plantões, o que fazemos?

Afonso sacudiu a cabeça e agachou-se, sentando sobre as pernas, em um cacoete que tinha quando ficava indignado com alguma coisa.

- Pois tens razão Alcebíades. Esses miseráveis estavam pondo a vida de todo mundo em risco.

E a conversa se estendeu pela noite a fora enquanto catalogavam e contavam as armas e munições encontradas.

Magaldi, aproveitando o ensejo dos diálogos de avaliação das equipes encarnadas, envolvidas na grande operação de combate ao crime, foi avaliando com os seus colaboradores desencarnados, as ações de integração entre os dois planos da vida, oportunizando que cada filho de Deus recolhesse no escopo de suas escolhas os instrumentos para o aperfeiçoamento a que fazia jus. Muitos, naquela noite, sorveram o fel das lágrimas de arrependimento, como os policiais corruptos e os criminosos apanhados. Já, os esforçados trabalhadores, empenhados em proteger a sociedade e combater o crime e não os criminosos, eram desafiados a sentirem o bem-estar que o cumprimento do dever deixa nas almas resolutas que o adotam como diretriz de vida.

No círculo de aprendizagem, realizado pela falange espiritual, os sentimentos eram de gratidão a Deus, esperança, coragem, admiração e alegria por parte de muitos; alguns poucos externavam tristeza e laivos de frustração, pelo pensamento cartesiano ainda arraigado nas almas que projetam os resultados na estrita consequência das ações prévias, sem contar com a liberdade ampla de escolha que os seres humanos possuem. Ao relatarem as observações a postura de generosidade e empatia de Alcebíades, mesclada a sua enérgica atuação foi referida por todos os integrantes da equipe, avaliando o equilíbrio em receber a confissão de Luiz Fernando, sabê-lo tramando contra a sua vida e mesmo assim, protegendo-lhe, bem como a sua companheira. Observando a equipagem ultrassensível, instalada na colônia e conectada ao presídio para avaliar as reações, emoções e sentimentos dos encarnados envolvidos, era possível perceber o conflito íntimo de cada um e a maneira como o esforço para a superação dos instintos se realizava.

Também foram inúmeras as apreciações sobre as reações dos colegas ao saberem dos agentes que estavam facilitando as ações criminosas. As nuvens de ódio e mágoa exteriorizadas se espalharam pela atmosfera dos lugares onde a ação policial se realizou. Muitos dos que experimentaram tais sentimentos foram infestados por vibriões que se alastraram pelo centro cardíaco e cerebral, preparando severas disfunções nos sistemas orgânicos correspondentes. De outra banda muitos endereçaram vibrações de compaixão pelos colegas, lamentando profundamente as atitudes, mas sem se permitirem a permanência nas esferas densas do desforço.

Os seareiros do bem encerraram o proveitoso estudo com a aplicação de energias salutares em todos os envolvidos nos lamentáveis acontecimentos do dia, dispensando o socorro do Alto aos justos e aos injustos, aos inocentes e aos culpados, pois semelhante ao sol que brilha sobre tudo e todos, o sol de luz, que é Jesus, também permanece luzindo no firmamento de nossas vidas, aguardando que aprendamos a percebê-lo e usufruir da sua luz e calor.


Referência: [1] Allan Kardec. O evangelho segundo o espiritismo (p. 195). FEB Publisher. Edição do Kindle. Cap. 12.

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