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Náufrago em Resgate - Cap. 12




Sede indulgentes, meus amigos, porquanto a indulgência atrai, acalma, ergue, ao passo que o rigor desanima, afasta e irrita. – José, Espírito protetor. (Bordeaux, 1863.)[1]


Alcebíades preparava o café deixado na bandeja em seu escritório. Há muitos anos cultivava esse hábito de fazer a primeira refeição no ambiente de trabalho, após uma rápida oração que lhe fortalecia e preparava para os embates do cotidiano difícil da prisão. Olhou para a refeição frugal e deu-se conta de que o sono das últimas noites estava povoado de cenas que não lembrava com nitidez, mas percebia se tratar de assuntos ligados ao trabalho.

Começou a sorver o primeiro gole, quando bateram à porta.

- Seu Alcebíades - era um dos agentes do plantão - posso entrar?

- Claro Norberto, quer um café?

- Obrigado! É que tem um dos internos querendo falar-lhe e como ele está aflito e bem agitado, resolvi trazer ao seu conhecimento. É o Luiz Fernando. Passou-me um bilhete na hora da revista, pedindo para guardar sigilo, pela sua vida.

Norberto era um dos agentes leais a Alcebíades e que compartilhava dos valores morais enobrecidos do diretor. Há vários anos dedicava-se ao voluntariado espírita em uma instituição da cidade, compreendendo em profundidade o seu papel naquele lugar que deveria se tornar um educandário para os que ali transitavam cumprindo suas penas. Exatamente pela postura íntegra e humana era respeitado pelos presos e pelos colegas, que quando necessitavam confiar algo mais grave, tanto do ambiente carcerário, quanto de suas vidas além muros era a ele que procuravam.

Ouvindo-o, Alcebíades sentiu um aperto no peito, como se algo muito sério fosse acontecer e não teve como não relembrar as cenas difusas dos seus sonhos.

- Certo, parceiro! Faz assim: retira o Luiz da cela e leva para a solitária. Explica a ele que é somente um “agá”, uma cortina de fumaça para a segurança dele. Chegando lá, eu vou conversar com ele e de lá já temos que ter uma saída para outro lugar. Chame o Carmelo e o Reinoldo para essa providência.

Alcebíades reunia os homens de sua confiança, inspirado por Magaldi, pois pressentia que algo grave estava para acontecer.

Luiz Fernando estava inquieto, parecia uma fera acuada. Quando foi levado por Norberto para a solitária ficou mais nervoso ainda, pois a vida no crime é como navegar em um mar revolto, onde a desconfiança, as traições e a morte estão sempre à espreita. Não há lealdade, nem verdade que se sobreponha aos interesses escusos de uma quadrilha. A vida do outro vale nada, o que faz com que cada qual tente se manter a salvo a qualquer custo.

Ao adentrar o espaço Allcebíades viu os olhos do preso brilhando na semi-escuridão. Era um faiscar de medo e desconfiança e ele logo tratou de acalmá-lo.

- Está tudo bem, Luiz, pode confidenciar o que você quiser e vamos garantir a sua segurança.

Magaldi e uma grande equipe estavam nesse momento acompanhando os desdobramentos, envolvendo em vibrações os partícipes da operação, e nesse momento fortalecendo o ânimo de Fernando para que levasse a termo o que tinha decidido.

- Seu Alcebíades, o que eu vou dizer aqui vai fazer de mim um homem morto, eles vão pedir a minha cabeça. Eu tenho que proteger uma pessoa lá fora. Preciso de proteção, o senhor me entendeu?

- Daqui tu não voltas mais pra cela. Estamos alinhando uma transferência para um lugar, o mais seguro possível, mas tu sabes como é esse meio, eu vou fazer tudo o que estiver ao meu alcance, mas mesmo assim eles podem te encontrar, cara.

- Não estou preocupado comigo, mas com a Dóris, diretor, se a casa cair pra mim ela vai pagar a conta. Eu preciso que ela fique longe das garras do pessoal lá. Vou te dar a visão do que acontece, mas só depois de saber que ela está em segurança.

- Ela sabe do que tu vais contar? Está envolvida?

- Luiz silenciou, fazendo Alcebíades perceber que não arrancaria nada dele se não encaminhasse a proteção pedida.

- Está bem, vou deslocar pessoal camuflado para vigiar a Dóris enquanto vemos a situação aqui. Depois tiramos ela para um local seguro também.

Luiz sentia na inflexão da voz, no olhar e na atmosfera que emanava do diretor da prisão que podia confiar naquilo que ele lhe propunha e começou a falar.

Ao meio-dia, a viatura saia com os três agentes rumo a uma penitenciária de segurança máxima, transferência sigilosa, levando Luiz Fernando.


Referência: [1] Allan Kardec. O evangelho segundo o espiritismo (p. 171). FEB Publisher. Edição do Kindle. Cap. 10.

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