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A questão da aristocracia intelecto-moral



Vinícius Lima Lousada(1)


Sabemos que o livro “Obras Póstumas” consiste numa compilação de textos inéditos escritos por Allan Kardec que foram publicados após a sua desencarnação, sob a licença de sua esposa Amelie.

Como educador, Kardec inicia o texto sobre as aristocracias em questão esclarecendo o seu conceito partir das raízes etimológicas da palavra para, adiante, tecer suas considerações sobre os tipos de aristocracias que se apresentaram ao longo do processo histórico da humanidade.

Aristocracia, em sua origem grega, significa o poder dos melhores.

Sempre houve líderes entre os povos, entre os grupos sociais em função da diversidade de aptidões e características dos membros de nossa espécie.

A figura da autoridade se tem feito necessária ante a heteronomia de muitos indivíduos, da necessidade de proteção dos mais frágeis e da notória carência de limites ante a manifestação das paixões, que sem freios, estabelecem o caos no organismo social.

A primeira de todas as aristocracias foi exercida pelos patriarcas ou os anciãos. A seguir, segundo a reflexão kardequiana, em função dos conflitos entre coletividades mais numerosas, surge as lideranças da força bruta, dos ágeis e inteligentes chefes militares, eis a segunda aristocracia.

Os filhos dos conquistadores, dos hábeis guerreiros passaram a herdar o poder de seus pais, colocado sobre as massas oprimidas como um direito divino, meio de se impor uma autoridade laureada pelo mistério e pela ordem dos céus, estabelecendo junto à ignorância popular o argumento necessário para a histórica manutenção do poder de poucos sobre muitos.

Com o tempo, a inteligência foi se desenvolvendo na forja do trabalho e as classes dominadas foram identificando a inconsistência argumentativa da aristocracia de nascimento, demandando pela igualdade natural entre os homens e, segundo Kardec, o poder econômico se impôs sobre as coletividades, dando origem a mais uma nova aristocracia: a do dinheiro.

O que não era possível obter mais a custa do título de nobreza, da autoridade herdada, agora era factível de se comprar por peso de ouro. Mas como nem sempre o dinheiro é adquirido legitimamente, outra aristocracia passa a surgir, estabelecendo o primado da inteligência, independente de classe social.

Para o observador atento da complexidade social de nossos dias, pode-se perceber a combinação dessas aristocracias de forma residual em grupos sociais, povos e, até mesmo nações.

Entretanto, desde o movimento iluminista vem avançando a relevância do uso da inteligência na organização do tecido social que, mal orientada pelo egoísmo do gênero humano, não permitiu ainda que se estabelecesse a justiça social, a fraternidade entre grupos diferentes e a paz como valor na convivência entre os povos.

O ínclito mestre, então, ressalta não ser a aristocracia intelectual a última vertente das aristocracias. Surgiria uma aristocracia intelecto-moral, a autoridade que se imporia naturalmente a parte daqueles que conjugam equilibradamente essas duas potências da alma: a moralidade e a inteligência.

Há quem pense ser isso impossível por causa do nível de egoísmo que vivemos por largos séculos, contudo a dificuldade de agora não atesta a sua impossibilidade no amanhã, ainda mais em se considerando a Lei do Progresso.

Recordemos o que nos ensinam os Espíritos Superiores:


"Nesse caso, como se explica que os povos mais esclarecidos sejam, frequentemente, os mais pervertidos? “O progresso completo constitui o objetivo, mas os povos, como os indivíduos, só o atingem gradualmente. Enquanto o senso moral não se houver desenvolvido neles, pode mesmo acontecer que se sirvam da inteligência para a prática do mal. O moral e a inteligência são duas forças que só se equilibram com o passar do tempo.” (...) (2)


A aristocracia intelecto-moral que, gradualmente há de se desenvolver, é um inédito viável que conta com o potencial educativo da Doutrina dos Espíritos sobre aquele que o adota como filosofia de vida, “contaminando” positivamente outros indivíduos, com os quais convive em sua ecologia de relações.

No entanto, para o bem se impor é preciso superar alguns percalços no imo daqueles que apostam valer a pena vivê-lo.

Allan Kardec, ao perguntar aos Espíritos a razão do mal predominar na Terra obtém a seguinte elucidação: “Pela fraqueza dos bons. Os maus são intrigantes e audaciosos; os bons são tímidos. Estes, quando quiserem, assumirão a preponderância.”(3)

Vejamos a clareza da resposta: o mal predomina porque os bons são fracos e tímidos, muitas vezes temem o juízo alheio ou ignorância dos maus, omitindo-se de manifestarem o bem através de suas atitudes.

Para surgir a aristocracia intelecto-moral aguarda a transformação das criaturas para melhor, aliando inteligência, amor e a coragem moral de viverem o bem no cotidiano, orientando a sua conduta pela normativa ética da caridade em todas as circunstâncias.

Daí a importância da formação de lideranças nos mais diversos espaços da sociedade, tendo em vista a promoção de processos educativos para a inserção de indivíduos norteados pela compreensão e vivência da Lei de Justiça, amor e caridade, à frente dos grupos sociais e coletividades, liderando porque aprenderam a servir ao bem comum, à paz e à genuína felicidade humana. Trabalhemos para esse objetivo, onde estivermos.


Referências:

(1) Diretor da Área de Formação de Lideranças Espíritas - FERGS.

(2) O livro dos espíritos, questão 780-b.

(3) O livro dos espíritos, questão 932.

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