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A coragem para ser bom - cap. 3



- Pare onde está. Fique ali Ramão – Nivaldo indicou um compartimento destinado a guardar artefatos do trabalho na fazenda - Não faça qualquer barulho, não saia daí. Deixe comigo.

A entonação da voz teve o condão de asserenar o ânimo do pobre homem. Como se uma mão amorosa o detivesse dando-lhe um aconchego, era o que sentira desde o momento do galpão, quando aquele homem indagara da sua presença ali, por isso ouviu o anfitrião e voltou para dentro enquanto Nivaldo dirigia-se para a frente da casa onde o capataz e os peões já estavam sendo abordados pelos homens recém-chegados.

Augusto, o capataz, mantinha os visitantes do lado de fora do pórtico e via-se a atitude hostil dos homens – feições agressivas, armados, portando rifles de precisão e com pistolas automáticas à vista nos cinturões.

Nivaldo se aproximou e cumprimentou-os com afabilidade, fazendo de conta não se aperceber da situação iminente de conflito.

- Bom dia, em que podemos ser úteis? – um dos homens que parecia o chefe da malta se aproximou e estendeu a mão, mostrando um anel incrustado com uma grande caveira de olhos vermelhos.

- Bom dia vizinho! Estamos buscando um bando de malfeitores que atacou a fazenda onde trabalhamos. Mataram gente e fugiram. São perigosos e estão a solta. Precisamos proteger as pessoas que moram aqui nas cercanias.

- Meu Deus – respondeu Nivaldo, mostrando preocupação – vamos acionar a polícia de imediato – e levou a mão ao bolso para acessar o celular.

- Não faça isso! - disse o homem, quase encostando-se no interlocutor, com ar ameaçador – o nosso patrão resolve as suas questões.

- Mas aqui é uma terra com lei, amigo – redarguiu Nivaldo – não se pode fazer justiça com as próprias mãos.

- Queremos apenas olhar as suas terras, não estamos em busca de conselhos – ergueu a voz o homem, enquanto os peões da propriedade foram cercando o grupo, visivelmente preocupados com o andamento da conversa.

- Desculpe amigo! Mas aqui nas minhas terras eu resolvo os problemas. Pode deixar, se meus homens perceberem alguma presença, tomo providências. Agora nos dê licença que vamos voltar ao trabalho.

- A propósito de que fazenda são? Quem é o seu patrão?

- Muito bem “vizinho” espero que nos avise de qualquer movimento suspeito e não se interponha em nossas ações – o homem velava uma ameaça nas palavras finais – não queremos ter dificuldades com ninguém, muito menos com os vizinhos - e não respondeu a pergunta.

Visivelmente contrariado os caçadores voltaram aos carros resmungando e saíram deixando um rastro de poeira para trás.

No esconderijo improvisado Ramão ouvira a conversa e seu coração batia acelerado, suava frio e lembrou-se da mãezinha – ah! Como lhe fazia falta aquela fé tão grande capaz de enfrentar a fome, a miséria, a doença, os maus tratos do pai, com a mesma serenidade de sempre. Pareceu ouvi-la falando com ele nas noites em que o estômago doía e ele adormecia depois que ela recomendava: - pede a Jesus, meu filho! Jesus cuida de todos nós. Ajoelhou-se no espaço diminuto entre arreamentos e outros pertences e pediu a Jesus, não só por ele, momentaneamente ao abrigo de uma alma generosa, mas pelos seus companheiros, perdidos sabe lá por onde, sob a mira das balas de gente tão perversa.

Enquanto ia balbuciando a prece que a genitora lhe ensinou, sua mente e seu coração sofrido foram se aquietando, enquanto uma entidade trajada pobremente, mas com um brilho espiritual intenso foi se aproximando e a sua luz foi inundando o lugar, suas mãos firmes e generosas afagavam os cabelos de Demétrio fazendo-o experimentar um suave relaxamento das tensões vividas nas últimas horas. Sia Tonha a humilde cuidadora dos invisíveis no mundo velava por ele, assim como durante a madrugada inspirou-os a buscarem na fazenda de Nivaldo o abrigo necessário.

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