A Casa do Pai
- fergs

- 29 de jul.
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Não podemos deixar de considerar o Pai, na parábola dos dois filhos, como a representação simbólica e amorosa de Deus. Este Pai é mais do que um personagem: é a imagem viva da bondade divina, que acolhe sempre, que espera com paciência, e que, em nenhum momento, desiste de seus filhos. Trata-se de um Pai que ama profundamente, que não se cansa de oferecer novas oportunidades — não apenas uma, mas tantas quantas forem necessárias ao despertar da consciência do filho.
O Pai é a própria imagem de Deus — não o Deus punitivo de antigas tradições, mas o Pai Celeste revelado por Jesus: amoroso, longânime, paciente, compassivo. Um Pai que respeita o tempo de cada filho, que não impõe, mas oferece, que não prende, mas acompanha com ternura e esperança. Aquele que vê ao longe e, quando identifica o filho no horizonte, corre ao seu encontro, vencendo os preconceitos sociais e culturais de sua época.
O Pai não espera explicações. Não cobra penitência. Ele veste, anela, calça, alimenta, festeja. Porque o que estava morto reviveu. Porque a vida não é castigo, é oportunidade. E, porque o erro, por mais danoso que seja, não apaga a filiação divina que carregamos.
Quem de nós não é, por sua vez, o filho pródigo que, por meio da reencarnação, retorna, a fim de ter uma nova oportunidade?
O filho pródigo representa cada um de nós.
Na perspectiva reencarnacionista trazida pelo Espiritismo, somos todos, em algum grau, o filho pródigo em retorno. Cada reencarnação é uma nova chance concedida por esse Pai misericordioso para retomar o caminho, refazer a jornada e refinar os sentimentos e pensamentos. Ao contrário da punição eterna, a Justiça Divina se manifesta pelo recomeço, pelo aprendizado contínuo e pelo amor que nunca abandona. O filho pródigo não é um ser à parte; ele representa a trajetória espiritual de todos nós, com nossas quedas, nossos erros, nossos afastamentos e nossos reencontros com a verdade que nos habita.
O Pai é Deus — não o Deus da condenação e da cólera, mas o Deus da pedagogia eterna, que educa sem humilhar, que espera sem pressa, que ama sem condições. Ele nos permite sair, experimentar, testar, errar, cair e levantar. Ele sabe que a liberdade é essencial para o amadurecimento da alma. Por isso, a parábola é um retrato perfeito da Lei da Reencarnação: saímos da Casa do Pai em busca de experiências, e ao final — cansados, famintos de sentido, sedentos de amor verdadeiro — retornamos à nossa origem. E o retorno é sempre recebido com festa. Não há censura, apenas acolhimento e esperança renovada.
O Pai é Deus nos oportunizando o retorno, sobretudo contando com nossa renovação efetiva através da transformação moral. O propósito da reencarnação é dar uma nova chance de crescimento, porque as leis Divinas, antecipadamente, conceberam que não teríamos como obter progresso e perfeição moral em uma única existência. Assim, a saída do Filho Pródigo nos representa muito bem quando saímos, erramos, fazemos escolhas equivocadas, mas construímos experiências próprias. O retorno dele representa a nova oportunidade que solicitamos: o renascimento pela reencarnação. Assim como o Pai do Filho Pródigo, Deus não julga nem no início e nem no fim, deixando seus filhos aprenderem pela própria experiência. Quando o filho sai o Pai permite, e quando retorna com a mente mais ampliada, o Pai acolhe.
A Casa do Pai é um lugar seguro para onde sempre podemos voltar. Isso acontece sempre após cada encarnação, normalmente carregadas de passeios imaturos e mal aproveitados, conforme as informações dos Espíritos que nos dão notícias preciosas do “lado de lá”. Todas às vezes que a desencarnação ocorre em condições de pouco aproveitamento evolutivo, e o Espírito retorna à vida espiritual, o Pai amoroso e justo coloca novamente o “anel da aliança” no dedo do filho e concede a ele uma nova oportunidade através da reencarnação. Desse modo, sempre o destino será a Casa do Pai, não há como o Pai abandonar qualquer de seus filhos, mesmo que sejam pródigos com os seus recursos e capacidades. O Pai sabe que o destino do filho é crescer e retomar sua filiação natural. Todo filho carrega o Pai dentro de si, mesmo que por vezes se esqueça disso. A desconexão é momentânea e pode levar um tempo, até que o filho, geralmente diante do sofrimento, sinta a necessidade do retorno ao Pai. A dor é o remédio para a fantasia que corrompe nossa vocação divina. Só há um lugar a que podemos retornar: a Casa do Pai.
A Casa do Pai, neste contexto, representa o estado de consciência plena, o centro da alma, o lar espiritual a que todos pertencemos. E, conforme os relatos dos Espíritos, que nos chegam por meio da literatura mediúnica, é também o espaço vibratório da pátria espiritual, onde sempre há alimento em abundância — o alimento do espírito: paz, esclarecimento, luz, propósito. Ao final de cada existência mal aproveitada, o Espírito retorna ao mundo espiritual carregando os frutos de suas escolhas. E, mesmo quando os resultados são escassos, o Pai lhe devolve o “anel da aliança” — símbolo da filiação eterna e da dignidade jamais perdida — e lhe oferece nova oportunidade, por meio da reencarnação.
O amor do Pai não desiste. A Misericórdia Divina não falha. Mesmo quando o filho se declara pobre de virtudes, falido de valores, distante de tudo o que é nobre, o Pai permanece fiel ao projeto Divino inscrito em cada ser: o retorno à essência, à luz, ao bem. Aquele que se sente distante de Deus está apenas mergulhado no esquecimento de si mesmo, porque todo o filho carrega o Pai dentro de si. A desconexão, ainda que prolongada, é sempre temporária. E é geralmente a dor — esse remédio silencioso da alma — que desperta a lembrança da Casa, que reorienta os passos e devolve a direção perdida.
Por isso, dor não é castigo. É instrumento da vida para o retorno a si mesmo. Ninguém existe fora da conexão divina. Mesmo quando em busca de experiências que se mostram aventureiras, há aprendizado e vivências que serão aproveitadas no momento oportuno.
Quando uma encarnação é aproveitada de forma satisfatória, o Pai está lá para nos receber. E, quando não é satisfatória, o Pai também está à espera. A demora do reencontro se dá às custas do orgulho e da rebeldia espiritual dos filhos.
O Pai é paciente porque sabe que, mais cedo ou mais tarde, todo filho retornará ao lar. Quando a encarnação é aproveitada com consciência, Ele recebe o filho com júbilo. E quando é mal aproveitada, Ele também aguarda, com ternura.
O reencontro, no entanto, pode ser adiado pelos próprios filhos. O orgulho, a resistência, a recusa em aceitar a própria limitação e aprender com ela, são fatores que retardam o retorno. A parábola nos ensina que o tempo da volta começa no instante em que o filho “cai em si” — ou seja, no momento da consciência, do arrependimento, da lucidez. “Quantos empregados de meu pai têm pão com fartura, e eu aqui morro de fome!” — exclama o filho. A fome da alma, a sede de sentido, a dor do vazio existencial são os sinais de que já é hora de voltar.
Na Casa do Pai há pão com fartura — há respostas, direção, consolo e sentido. Mas é preciso pedir. E aqui entra outro ensinamento de Jesus, quando nos diz: “Até agora nada pedistes em meu nome; pedi, e recebereis, para que o vosso gozo se cumpra.” (João 16:24). A oração é um caminho de retorno. Mas nem todo pedido feito em oração é coerente com a vontade divina. Emmanuel, no capítulo 66 do livro Caminho, Verdade e Vida, esclarece que muitos pedidos são feitos não “em nome de Jesus”, mas em nome das próprias vaidades e desejos passageiros. Pedir em nome de Jesus é aceitar a sabedoria de sua vontade, confiar no que Ele vê além do que podemos enxergar.












































