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Entrelaçamento entre Inclusão e as Leis Morais

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    fergs
  • 30 de jun.
  • 10 min de leitura

    Sonia Hoffmann

 

Assim como as Leis Morais, contidas na parte terceira de O Livro dos Espíritos, refletem e expressam os atributos de Deus, nelas pode-se encontrar a profunda articulação e o intrínseco entrelaçamento com os fundamentos filosóficos de inclusão na importante proposta de responsabilização social e da dignidade humana.

 

As leis morais da vida, como assinala Joanna de Ângelis (2024), são impostergáveis, ninguém as podem destruir, estão insculpidas na consciência de cada criatura. O mesmo acontece com os princípios apresentados na ação includente, pois o ser em sua individualidade os traz em si - independentemente de ter alguma deficiência, neurodivergência, doença, transtorno ou qualquer outra característica. A diferença faz parte da natureza e todos, em alguma proporção, desejam sentir-se incluídos, pertencentes, visibilizados.

 

A primeira das conexões encontramos na Lei de Adoração, por ser esta representada como a comunicação com Deus pela prece, pela atitude amorosa para com Ele e para com a sua criação,

 

“Em que consiste a adoração?”

“Na elevação do pensamento a Deus. Deste, pela adoração, aproxima o homem sua alma” (Kardec, 2013b, q. 649).

 

A comunicação sensível, amorosa, sincera e compreensiva entre as pessoas é fator essencial na ação inclusiva. É a partir dela, nas mais diversas opções, que se estabelece o entendimento das necessidades, dos esclarecimentos, das trocas (in)formativas e das possibilidades de ajudas. A relação dialógica é fundamental, nela apresentando-se o amor a Deus pelo amor ao próximo.

 

"... Como tudo se encadeia sob a direção do Altíssimo, todas as lições recebidas e aceitas virão a encerrar-se na permuta universal do amor ao próximo. Por aí, os Espíritos encarnados, melhor apreciando e sentindo, se estenderão as mãos, de todos os confins do vosso planeta. Uns e outros reunir-se-ão, para se entenderem e amarem, para destruírem todas as injustiças, todas as causas de desinteligências entre os povos" (Kardec, 2013a).

 

A lei do trabalho traz outra vinculação com o ato includente. Toda ocupação útil, conforme a questão 675 de O Livro dos Espíritos (Kardec, 2013b), define trabalho e não somente aquele remunerado ou de caráter material. Tendo sido imposto ao homem com o objetivo de promoção do aperfeiçoamento da sua inteligência, o trabalho traz a condição de assegurar seu bem-estar, felicidade, progresso e saída da sua infância espiritual.

 

"O trabalho se alicerça nas leis de Amor que regem o Universo. Trabalha o verme no solo, o homem na Terra e o Pai nas Galáxias. A vida é um hino à dinâmica do trabalho. Não há na Natureza o ócio. O aparente repouso das coisas traduz a pobreza dos sentidos humanos. A vida se agita em toda parte. O movimento é lei universal em tudo presente. Não te detenhas a falar sobre o mal. Atua no bem. Não te escuses à glória de trabalhar pelo progresso de todos, do que resultará a tua própria evolução" (Ângelis, 2024).

 

O ser, considerado como típico ou atípico relativamente às convenções humanas, apresenta condições para exercer, (in)diretamente, alguma ocupação ou ação útil. Quando alguém oportuniza, orienta e incentiva o desenvolvimento e amadurecimento da melhor ou maior autonomia, independência e gerenciamento do mundo interno e externo de outra pessoa na perspectiva do momento presente e para o futuro, respeitando suas competências, possibilidades, aptidões e interesses, está conectado ao cumprimento da lei moral do trabalho e à proposta de inclusão. Da mesma forma, a busca por ser incluso através da prática do bem, de atividades saudáveis e dignas, pelo seu melhoramento moral e intelectual, por sentir-se útil, realizado e valorizado como criação Divina confere a quem

vivencia qualquer modalidade de diferença a realização de ato laboral extremamente válido e necessário.

 

"Sê abnegado! O que faças e como faças constituirá emulação para as criaturas que seguem ao teu lado. Sem que o percebas és inspirado por alguém, motivado por outrem, a teu turno modelo para outros que te seguem em pós. Perante a vida és cocriador junto a Nosso Pai" (Ângelis, 2024).

 

Concernente à lei de reprodução, a obra kardequiana não nos remete somente à reflexão sobre questões vinculadas ao ato reprodutivo do corpo físico pela união de elementos femininos e masculinos, mas nos proporciona indicativos para analisar o quanto a lei de reprodução colabora para as necessárias reencarnações, no melhoramento cultural e social da humanidade e no exame das consequências trazidas pelo isolamento. Ou seja, nesta lei ocorre o despertar para a importância da geração e continuidade de um legado de valores, hábitos e modelos morais contributivos para a interação social harmônica, ética e responsável.

 

A aceitação da diversidade humana, o acolhimento de alguém com suas diferenças e a valorização da vida, dos direitos à constituição de vínculos afetivos e sociais, da participação das pessoas com a sua individualidade nos mais distintos espaços, ambientes e atividades para a (co)elaboração de conceitos e reflexões que promovam a emancipação do ser, com suas singularidades e peculiaridades, consistem valorosos pressupostos da inclusão disponibilizados para as humanidades.

 

"O auxílio ao próximo é o seu melhor investimento. Valorize os outros, a fim de que os outros valorizem você. Pense nos outros, não em termos de angelitude ou perversidade, mas na condição de seres humanos com necessidades e sonhos, problemas e lutas semelhantes aos seus. Se a solidão valesse, as Leis de Deus não fariam o seu nascimento na Terra entre duas criaturas, convertendo você em terceira pessoa para construir um grupo maior" (André Luiz, 2023, p.64-65).

 

Os esclarecimentos trazidos pela Doutrina Espírita quanto à lei de conservação repercutem na utilização com sabedoria dos recursos materiais, esquivamento de desperdícios e também na preservação de atributos e virtudes morais. Neste aspecto, existe consonância com os preceitos inclusivos, pois para que uma ação seja considerada includente ela precisa garantir a preservação da integridade e dignidade da pessoa no seu mais amplo direito de cidadania e respeito mútuo por meio de estratégias e interações seguras, apropriadas e coerentes.

 

A destruição é lei da Natureza. “Preciso é que tudo se destrua para renascer e se regenerar. Porque, o que chamais destruição não passa de uma transformação, que tem por fim a renovação e melhoria dos seres vivos” (Kardec, 2013b, q. 728).

 

Léon Denis aponta, na obra Catecismo espírita, ser todo ato destrutivo que excede os limites da necessidade violação da lei divina. Ainda mais condenável à destruição feita com crueldade.

 

"A razão humana é ainda muito frágil e não poderá dispensar a cooperação da fé que a ilumina, para a solução dos grandes e sagrados problemas da vida. Em virtude da separação de ambas, nas estradas da vida, é que observamos o homem terrestre no desfiladeiro terrível da miséria e da destruição. Pela insânia da razão, sem a luz divina da fé, a força faz as suas derradeiras tentativas para assenhorear-se de todas as conquistas do mundo. Falastes demasiadamente de razão e permaneceis na guerra da destruição, onde só perambulam miseráveis vencidos; revelastes as mais elevadas demonstrações de inteligência, mas mobilizais todo o conhecimento para o morticínio sem piedade, pregastes a paz, fabricando os canhões homicidas; pretendestes haver solucionado os problemas sociais, intensificando a construção das cadeias e dos prostíbulos. Esse progresso é o da razão sem a fé, onde os homens se perdem em luta inglória e sem-fim" (Emmanuel, q.199).

 

Quando pensamos em destruição, geralmente é estabelecida referências com calamidades, guerras, assassínios, mas também é possível refletir sobre a importância da destruição de preconceitos, de estigmas, de marcas escravizantes de alguém no descrédito, no julgamento, na clandestinidade, na marginalização. Neste sentido, o propósito da inclusão mantém ligação com a lei de destruição quando trata do rompimento de barreiras, fronteiras relacionais, obstáculos desenvolvimentais. Tanto quanto a Doutrina Espírita, inclusão tem por uma das finalidades o combate à crueldade, à violação dos direitos e incentiva a dissolução da ignorância, tirania, hostilidade.

 

Deus fez o homem para viver em sociedade. Portanto, a vida social é uma das leis naturais. A palavra e todas as demais faculdades necessárias para a vida de relação não foram concedidas inutilmente às criaturas.

 

"A vivência cristã se caracteriza pelo clima de convivência social em regime de fraternidade, no qual todos se ajudam e se socorrem, dirimindo dificuldades e consertando problemas. Viver o Cristo é também conviver com o próximo, aceitando-o conforme suas imperfeições, sem constituir-lhe fiscal ou pretender corrigi-lo, antes acompanhando-o com bondade, inspirando-o ao despertamento e à mudança de conduta de modo próprio" (Ângelis, 2024).

 

A lei de sociedade é eminentemente inclusiva, pois cooperação, construção conjunta, reciprocidade e parceria são construtos fundamentais ao intercâmbio de conhecimentos assim como formação de novos hábitos, expressões atitudinais e ampliação/fortalecimento de laços afetivos desde o microssistema familiar ao macrossistema da vida terrestre possibilitados pelo convívio na diversidade. Não basta, porém, estar em simples condição de viver em, mas é preciso interagir com por meio de mudança atitudinal (quando necessário), de vontade ativa, intencional e com sentido sociológico.

 

Inclusão é processo dinâmico e plurilateral. Para uma sociedade ser definida como inclusiva, portanto, ela precisa estar intimamente correlata à lei do progresso. A conquista desta caracterização de civilidade é alertada em O Livro dos Espíritos, questão 793:

 

"Por que indícios se pode reconhecer uma civilização completa?

'Reconhecê-la-eis pelo desenvolvimento moral. Credes que estais muito adiantados, porque tendes feito grandes descobertas e obtido maravilhosas invenções; porque vos alojais e vestis melhor do que os selvagens. Todavia, não tereis verdadeiramente o direito de dizer-vos civilizados, senão quando de vossa sociedade houverdes banido os vícios que a desonram e quando viverdes como irmãos, praticando a caridade cristã. Até então, sereis apenas povos esclarecidos, que hão percorrido a primeira fase da civilização." (Kardec, 2013b)

 

Kardec (2013b), em seu comentário a este questionamento, pondera:


"À medida que a civilização se aperfeiçoa, faz cessar alguns dos males que gerou, males que desaparecerão todos com o progresso moral. De duas nações que tenham chegado ao ápice da escala social, somente pode considerar-se a mais civilizada, na legítima acepção do termo, aquela em que exista menos egoísmo, menos cobiça e menos orgulho; em que os hábitos sejam mais intelectuais e morais do que materiais; em que a inteligência possa desenvolver-se com maior liberdade; em que haja mais bondade, boa-fé, benevolência e generosidade recíprocas; em que menos enraizados se mostrem os preconceitos de casta e de nascimento, por isso que tais preconceitos são incompatíveis com o verdadeiro amor do próximo; em que as leis nenhum privilégio consagrem e sejam as mesmas, assim para o último, como para o primeiro; em que com menos parcialidade se exerça a justiça; em que o fraco encontre sempre amparo contra o forte; em que a vida do homem, suas crenças e opiniões sejam melhormente respeitadas; em que exista menor número de desgraçados; enfim, em que todo homem de boa vontade esteja certo de lhe não faltar o necessário".

 

Relativamente à lei de igualdade, é esclarecido ser obra do ser humano e não de Deus a desigualdade das condições sociais. Na concepção inclusiva, todos apresentam singularidades, consequentemente particularidades, mas esta condição não pode ser confundida com indiferença, pois cada pessoa apresenta direitos e responsabilidades funcionais de acordo com sua aptidão, competência, aperfeiçoamento desenvolvimental.

 

"Por que não outorgou Deus as mesmas aptidões a todos os homens? 'Deus criou iguais todos os Espíritos, mas cada um destes vive há mais ou menos tempo, e, conseguintemente, tem feito maior ou menor soma de aquisições. A diferença entre eles está na diversidade dos graus da experiência alcançada e da vontade com que obram, vontade que é o livre-arbítrio. Daí o se aperfeiçoarem uns mais rapidamente do que outros, o que lhes dá aptidões diversas. Necessária é a variedade das aptidões, a fim de que cada um possa concorrer para a execução dos desígnios da Providência, no limite do desenvolvimento de suas forças físicas e intelectuais. O que um não faz, fá-lo outro. Assim é que cada qual tem seu papel útil a desempenhar" (Kardec, 2013b, q. 804).

 

Propriamente livre, cada pessoa tem a possibilidade de fazer escolhas devido a concessão divina do livre-arbítrio. Por si só, esta dádiva representa a lei de liberdade. Contudo, a ninguém foi atribuído o direito de invadir a privacidade alheia, de sobrecarregar ou impedir o desenvolvimento de alguém nas mais variadas perspectivas. Para tais condutas serem evitadas, Deus inscreveu na consciência humana os limites da sua liberdade.

 

"Jamais devendo constituir tropeço na senda por onde avança o seu próximo, é-lhe vedada a exploração de outras vidas sob qualquer argumentação, das quais subtraia o direito de liberdade. Sem dúvida, centenas de milhões de seres transitam pela infância espiritual, na Terra, sem as condições básicas para o autodiscernimento e a própria condução. Apesar disso, a ninguém é lícito aproveitar-se da circunstância, a fim de coagir e submeter os que seguem na retaguarda do progresso, antes competindo aos melhor dotados e mais avançados distender-lhes as mãos, em generosa oferenda de auxílio com que os educarão, preparando-os para o avanço e o crescimento. Liberdade legítima decorre da legítima responsabilidade, não podendo aquela triunfar sem esta. A responsabilidade resulta do amadurecimento pessoal em torno dos deveres morais e sociais, que são a questão matriz fomentadora dos lídimos direitos humanos" (Ângelis, 2024).

 

Todos têm essencialmente a liberdade de pensar, falar e (inter)agir. Porém, esta liberdade implica o respeito e em não impedir o exercício dos semelhantes direitos também disponibilizados ao próximo. Esta é uma ação includente e inclusiva. Da maneira que for, quem apresenta alguma deficiência ou diferença tem o direito (e mesmo o dever) de manifestar-se, elastecer suas aptidões, aperfeiçoar suas habilidades, optar com quem deseja relacionar-se, fazer suas escolhas sociais, acadêmicas e profissionais mesmo adotando vias alternativas.

 

Referentemente à lei de justiça, de amor e de caridade, é explicado em O Livro dos Espíritos que justiça é definida pelo respeito de alguém aos direitos dos demais. Sequencialmente, na questão 886, é orientado ser o BIP (benevolência para com todos, indulgência para as imperfeições dos outros, perdão das ofensas) o verdadeiro sentido de caridade, como Jesus a entendia.

 

Quando "alguém recebe o magnetismo do amor, sem que o perceba, vitaliza-se, acalma-se, renova-se e ama. Nem sempre devolve àquele que lhe doa a força do amor, não obstante retribui a dádiva esparzindo-a e dirigindo-a a outrem. E isto é o mais importante" (Ângelis, 2024).

 

Nesta lei, é resumida toda a proposta filosófica de inclusão, pois nela estão presentes: ser e interagir de maneira justa perante as necessidades e possibilidades de alguém, esperar e solicitar comportamentos, atitudes e respostas adequadamente e de modo coerente às condições evolutivas moral, intelectual e físicas, promover interações amorosas, empáticas e com alteridade.

 

A reflexão e o estudo relativo ao entrelaçamento dos princípios inclusivos com as Leis Morais consolida a transversalização necessária do ato inclusivo com os preceitos doutrinários, habilitando a libertação da fragilidade espiritual da humanidade pela expansão do conhecimento.


 

Referências

 

ANDRÉ LUIZ (Espírito). Sinal verde. Psicografia de Francisco Cândido Xavier. Brasília, DF: FEB, 2023. Mensagem 27: Perante os outros.

ÂNGELIS, Joanna (Espírito). Leis morais da vida. Psicografia de Divaldo Pereira Franco. Salvador: LEAL, 2024.

DENIS, Léon. Catecismo espírita. Cap. II: Moral espírita - sua definição e aplicação, como guia e modelo para o homem. 

EMMANUEL (Espírito). O Consolador. Psicografia de Francisco Cândido Xavier. q. 199. [recurso eletrônico].

KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. Brasília, DF: FEB, 2013a. Cap. XI: Amar o próximo.

KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. 93. ed. Brasília, DF: FEB, 2013b. p. 305-395.

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